sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

João Armando


João Armando chegou à I Liga em 1995, para jogar na União de Leiria, mas seria ao serviço do Paços de Ferreira, anos mais tarde, que se afirmaria no futebol português.
Dois anos na cidade do Lis e três na 'capital do Móvel' valeram-lhe 125 jogos e três golos no nosso principal campeonato.
O antigo central começou-se a destacar na I Liga em 1997, quando marcou o único golo de um jogo que terminou com vitória da U. Leiria sobre o Sporting. A descida dos leirienses nesse ano, levou João Armando a fazer três temporadas consecutivas na Liga de Honra, até regressar ao topo pelo Paços de Ferreira, clube que ajudou a subir de divisão com uma recuperação estrondosa.
Pelos pacenses na I Liga, João Armando realizou noventa em jogos em três temporadas, mas saiu do clube no final de 02/03, sem que, ainda hoje, treze anos depois, saiba as razões da sua saída.
Seguiram-se passagens por Portimonense, Académico de Viseu e Imortal, antes de terminar a carreira onde a tinha começado: no Lusitano VRSA, onde se retirou, primeiro, em 2008, e anos mais tarde, em 2013, quando já com 40 anos, fez meia época na III Divisão Nacional.
Atualmente com 44 anos, trabalha na área da segurança e é treinador-adjunto da equipa sénior do Louletano, que compete no Campeonato de Portugal Prio.

Prémio Carreira: Começou no Lusitano VRSA e passou pelo Benfica Castelo Branco, até chegar ao Leiria e à I Liga. Como surgiu esta oportunidade?
João Armando: É verdade. Fiz a minha formação e subi a sénior no Lusitano, e depois saí da minha zona de conforto, deste 'cantinho' de Portugal que é o Sotavento algarvio, para jogar no Benfica de Castelo Branco. Essa possibilidade apareceu através do mister Benvindo Assis, que tinha uma grande amizade com o Pedro Gomes, ex-jogador do Sporting, e que era o treinador do Benfica Castelo Branco na altura. Estive lá dois anos, e lembro-me que na segunda época, o Joaquim Peres, que era o adjunto do Pedro Gomes e subiu a principal nesse ano, veio ter comigo antes de um treino se iniciar e disse que não ia poder contar comigo. Eu assustei-me e estranhei, naturalmente. Mas ele disse para ficar tranquilo, porque o Estrela da Amadora estava interessado em mim, e estava em negociações com o BC Branco. Mas entretanto os clubes não chegaram a acordo e não saí. No segundo ano continuei a jogar e a destacar-me, até porque sempre fui um central que fazia golos, e um dia apareceu um empresário com uma simples questão, se queria jogar na I Liga, e se não me importava de ir à experiência. E eu respondi que claro que não me importava. Primeiro ele tentou colocar-me à experiência no Boavista, que era treinado pelo Manuel José, que é meu conterrâneo, aqui de Vila Real de Santo António, e até já nos conhecíamos, porque temos um grande amigo em comum, que é o Sr. Vasques, antigo jogador do Atlético e do Belenenses. Mas o Boavista, naquela altura, era um clube muito forte, que ambicionava outras coisas, como ir à Taça UEFA, por exemplo, e o Manuel José disse para esperarmos mais um tempo, que ainda era miúdo e que aquele não era o momento certo. O Pedro Maia, como tinha apostado em mim, não quis esperar muito e ligou ao Vítor Manuel, que estava na União de Leiria. Estive duas semanas à experiência, e reencontrei lá o grande amigo da minha vida, Ferreira, que infelizmente já faleceu. Tinhamos uma verdadeira amizade, já tinhamos jogado juntos no Lusitano VRSA, e ajudou-me bastante nesse período, foi peça fundamental na minha adaptação, mas todo o grupo me aceitou na perfeição, e acabei por ficar e assinar com a União de Leiria.

PC: Recorda-se da estreia na I Liga?
JA: Recordo. Foi com o D. Chaves, em casa, ganhámos 4-1, e entrei nos minutos finais.

PC: Nessa primeira época de Leiria fez oito jogos como suplente utilizado no campeonato. Foi uma época que serviu, fundamentalmente, de adaptação à I Liga?
JA: Sim, de adaptação e de incertezas também, porque vinha da II Divisão B e passei por dificuldades. Lembro-me perfeitamente que até ao jogo com o Marítimo, na Madeira, era dado como jogador para dispensar, e tive que batalhar contra tudo isso. Nesse jogo, o Paulo Duarte lesionou-se, e eu estava no banco juntamente com o Sérgio, que era outro central do plantel. O mister mandou-nos aquecer os dois, e recordo-me de pensar como era possível irmos os dois, porque naquela altura sentia-me em melhores condições para jogar do que o meu colega, não quero dizer que era melhor, ou que era superior, simplesmente pensava que estava melhor naquela fase, e que seria primeira aposta. Acabei por entrar, perdemos 1-0, mas o jogo correu-me bem. Durante o voo de regresso, o Crespo falou com o mister Vítor Manuel e depois veio-me confortar, dizendo para ter calma e esquecer a ideia da dispensa, que tinha falado com o mister e que eu não ia sair. E, de facto, na terça-feira seguinte isso confirmou-se e acabei por não ser dispensado.

PC: Na segunda época, faz o golo da vitória diante do Sporting, mas o Leiria fez uma época abaixo das expetativas e acabou por descer...
JA: Segundo me disseram na altura, essa foi a primeira vez que o Leiria ganhou ao Sporting na sua história. Claro que foi um grande momento para mim marcar o golo da vitória sobre um grande. Nesse ano, penso que não houve estabilidade. Não digo da parte da direção ou da parte financeira, porque nesse aspeto cumpriram sempre enquanto lá estive. Mas tivemos três treinadores nessa época, as coisas simplesmente não saíam e não surgiam, e quando "acordámos" já foi tarde, porque fizemos um ponta final muito boa, mas não conseguimos a permanência.

PC: Volta à I Liga três anos depois, com a camisola do Paços de Ferreira, onde em três épocas fez quase cem jogos no campeonato. Esse período foi a afirmação do João Armando enquanto jogador de I Liga?
JA: Foi, sem dúvida alguma. A minha passagem pelo Paços foi marcante a todos os níveis. Fui Pai uns meses antes de ir para Paços, quando estava em Penafiel, e tive toda a estabilidade tanto a nível emocional, como futebolístico e familiar. Também foi nessa altura que comecei a perceber o que poderia fazer quando deixasse de jogar, porque o futebol não dura sempre, e quando chegámos a uma certa altura da carreira, temos que começar a olhar para o futuro. Nesses anos abri horizontes, digamos assim, e comecei a ter alguns pensamentos sobre a minha vida futura. Mas foram três épocas magníficas, em que fazia em média trinta jogos por temporada, falhando sempre alguns jogos, porque tendo em conta a minha posição, acabava sempre por estar suspenso em uma ou outra ocasião. Foram três anos onde atingi o auge da minha carreira, numa cidade fantástica e num clube fantástico, que cumpre sempre com as suas obrigações, e acabámos por fazer história na II Liga, porque a catorze jornadas do fim estávamos perto de descer, e ainda fomos campeões nacionais. E não esqueço, também, as vitórias sobre os três grandes na primeira época que fizemos na I Liga - 2000/2001.

PC: Como é que um titular durante três temporadas sai para a II Liga?
JA: Olhe, ainda ando à procura dessa resposta, sinceramente. No último ano que estive no clube, já com mais de meia época decorrida, houve um diretor que veio ter comigo e disse que queriam renovar, e eu disse claro que sim, quando quiserem, só que a verdade é que o tempo foi passando e nunca sequer falaram comigo. Até hoje não consigo perceber, porque pela parte financeira não terá sido, porque se fosse esse o motivo, teriam-me feito uma proposta de maneira a que eu recusasse, penso eu.


PC: Do Paços saiu para o Portimonense. Não teve convites para continuar na I Liga?
JA: Não, por acaso não. Aquilo que começava a ver já naquela altura, e que hoje se vê cada vez mais, é que não é pelo valor de um jogador que se lhe dá a oportunidade. É preciso mais qualquer coisa, a nível de conhecimentos/amizades, ou outras coisas, não sei... Se aparecer um jogador que seja fora-de-série, não precisa dessas coisas, porque os seus atributos são mais do que suficientes. Mas, caso contrário, penso que não depende apenas e só do jogador, cada vez mais funciona assim, e isso deixa-me triste com o futebol.

PC: Fez cinco temporadas na I Liga, qual destaca como a sua melhor?
JA: Penso que a primeira época com o Paços na I Liga. Não só para mim, como talvez para todos os meus colegas desse ano. Foi um ano magnífico. O grupo continuou praticamente o mesmo, vinha com rotina de vitórias, e os que entraram entenderam perfeitamente a mensagem que o mister José Mota passava, e que era fundamental, porque ele dizia-nos sempre que podíamos ganhar em qualquer campo. Nós jogávamos com alegria, tinhamos prazer no que fazíamos, e jogávamos, essencialmente, para nos divertirmos, e esse era o caminho. Prova disso, como já falei, são as vitórias sobre os três grandes nessa época.

PC: Quais os jogos que lhe trazem mais recordações?
JA: É inevitável o jogo contra o Sporting, pelo Leiria, em que faço o golo da vitória e que me ficará eternamente marcado. Pelo Paços recordo, principalmente, as vitórias em Alvalade e na Luz.
Pelo lado negativo, recordo-me de um jogo com o Sporting, pelo Paços, na Mata Real, que perdemos 6-0, mas que nos primeiros vinte minutos, lembro-me como se fosse hoje, fomos extraordinários, estivemos sempre em cima do Sporting, e quem podia estar em vantagem éramos nós. Mas aquilo "virou" e ao intervalo estávamos a perder 4-0. Foi algo "estranho" o que aconteceu naquele jogo. Lembro-me que nesse dia tinha os meus Pais em minha casa e quando cheguei vinha tão desiludido que nem lhes falei, fui diretamente para o meu quarto e "refugiei-me" lá a chorar, parecia que ia acabar o Mundo, porque eu vivia para o futebol, como os meus colegas naturalmente, mas aquele resultado mexeu muito comigo.

PC: Qual foi o melhor momento da sua carreira?
JA: Tive vários momentos muito bons... Não posso esquecer a minha estreia como sénior, no Lusitano VRSA, na Liga de Honra. Foi um momento marcante, que significou o início do meu percurso no futebol. Depois, a mudança para Castelo Branco, onde vivi dois anos maravilhosos e que foram o "reforço" do início do percurso. Naturalmente que a chegada à Liga foi um momento especial, e depois os anos que passei em Paços de Ferreira, onde atingi tudo o que ambicionava quando era miúdo, vivi tempos muito bons a todos os níveis, e onde me senti plenamente realizado.

PC: O que faltou atingir na sua carreira?
JA: Faltou eu procurar mais qualquer coisa. Fiz o meu caminho, o caminho que ambicionava desde miúdo, mas faltou isso mesmo, procurar mais qualquer coisa para a minha carreira, atingir um patamar mais elevado... Quando estava em Leiria, lembro-me que os jornalistas chegaram-me a questionar se não queria ir à Seleção, por exemplo. É natural que queria chegar lá, mas quando se joga num clube mais pequeno, se dissermos que queremos ir à Seleção, nem sequer somos levados a sério, na minha opinião, porque é mais complicado atingirmos esse meta quando não jogamos num dos três "grandes".

PC: Qual o ponta-de-lança mais difícil que defrontou?
JA: Fisicamente, o Nuno Gomes quando estava no Boavista. Psicologicamente, aquele que deixava um defesa de rastos, não só cá como nas competições europeias, o Mário Jardel. Era muito difícil controlá-lo e segurá-lo porque ele tinha "faro" de golo. Numa ocasião pelo Paços, fomos a Alvalade, e à entrada para o túnel houve um jornalista que me perguntou como ia fazer em relação ao Jardel, e eu lembro-me de lhe responder que o meu objetivo era que o Jardel não fizesse golos, porque se ele não marcasse, os jornais iriam falar de mim no dia seguinte.

PC: Que momento vivido no futebol pode/quer partilhar?
JA: Quando estava no Leiria, fomos à Luz jogar contra o Benfica e perdemos 4-0. Depois do jogo, na viagem de regresso para Leiria, vinhamos todos cabisbaixos e calados no autocarro, naturalmente, e o Ferreira que tinha sido o guarda-redes nesse jogo e que vinha sentado atrás de mim, tocou-me no ombro e disse: "Joni, o União perdeu, mas o nosso Benfica ganhou" (risos). E eu tive que esboçar um sorriso, porque num momento daqueles, ele conseguiu reagir bem e sair-se com aquela frase. Era uma pessoa fantástica e, nas situações mais difíceis, sabia sempre como dar a "volta por cima".

PC: Atualmente trabalha na área da segurança e é adjunto do Louletano. As suas ambições no futebol passam por continuar como adjunto ou ambiciona ser treinador principal?
JA: Comecei como adjunto do Lusitano VRSA, e a meio da época passada fui convidado pelo Ivo Soares para ir com ele para o Louletano. Neste momento, ganhámos uma grande amizade e temos uma ambição conjunta de mostrar que o que fazemos tem valor e é válido, e que merecemos uma oportunidade noutros campeonatos. Naturalmente que ninguém sabe o dia de amanhã, e se aparecesse uma proposta para ser treinador principal, não diria que não, mas todos os dias vou aprendendo, adquirindo novas ideias e vou-me empenhando em fazer melhor dia após dia.


A carreira de João Armando, aqui.

Veja aqui, ao terceiro minuto do vídeo, o golo de João Armando diante do Sporting:


Um golo de João Armando, pelo Paços de Ferreira, ao Gil Vicente:

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Riva


Ao fim de cinco meses de existência, o Prémio Carreira decidiu 'alargar os horizontes' e entrevistar, pela primeira vez na sua história, um dos muitos estrangeiros que marcaram o futebol português.
Atravessámos o Atlântico e chegámos a Riva: o antigo extremo brasileiro jogou oito anos em Portugal, representou os grandes rivais minhotos Guimarães e Braga, e foi dando cartas através da velocidade e técnica que possuía.
Foi Vítor Urbano quem lhe abriu as portas de Portugal, em 1993, quando o trouxe para o Paços, e seria o mesmo Vítor Urbano a "repescar" Riva para o nosso futebol, dois anos mais tarde, em 1995, trazendo-o para o Chaves.
Seguiram-se quatro anos em Guimarães, onde privou, entre outros, com Branko Milovanovic, um talento incompreendido (ou mal aproveitado?) que passou pelo futebol português. Com uma grande história na 'Cidade Berço', trocou o Vitória pelo Braga em 2000, onde viria, dois anos mais tarde, a despedir-se do futebol nacional, regressando ao seu País para vestir a camisola da Ponte Preta.
Com mais de 200 jogos e 28 golos no nosso principal campeonato, Riva fez grande parte da sua carreira em Portugal e só tem elogios para tudo o que viveu por terras lusas.
Aos 46 anos, é treinador e responsável pelo projeto Riva Sports, uma espécie de escola de futebol que vai ajudando a integrar e a "lançar" os jovens de Itabira, sua cidade-natal.

Prémio Carreira: Maior parte dos portugueses recorda-se de si em Guimarães, mas foi o Paços de Ferreira que o trouxe para Portugal. Como surgiu a oportunidade de vir jogar para cá?
Riva Silva: Olha, surgi para o futebol no Valério Doce de Itabira, e fui considerado o melhor jogador de base de Minas Gerais. Aí, o Cruzeiro me contratou para disputar o campeonato brasileiro. Depois do campeonato terminar, o empresário Adelson, junto com mister Vitor Urbano do Paços de Ferreira, me contratou por empréstimo.

PC: E na estreia na I Liga, marcou logo um golo...
RS: Sim, contra o Gil Vicente. Lembro que foi um dia especial, pois era a minha estreia e o mister disse que ia fazer um golo. O estádio da Mata Real estava lotado de adeptos. Foi uma festa. Mas quando cheguei aí, no primeiro jogo amistoso que fiz, contra o CSKA Sófia da Bulgária, fiz dois golos também.

PC: No fim da época deixou Portugal e voltaria um ano depois para jogar no Chaves. Porquê este "intervalo" na passagem por cá e porquê o Chaves na hora do regresso?
RS: Voltei ao Brasil, pois o Paços não tinha capital para comprar o meu passe, e a direção do Paços mudou. Ai fui jogar no América, no campeonato estadual. Num belo dia, depois do treino, chega meu grande amigo mister Urbano e perguntou pra mim: "Quer voltar para Portugal mais uma vez para trabalhar comigo?" Na mesma hora aceitei. Mister Urbano me ajudou muito.

PC: Depois surgiu a mudança para o Guimarães...
RS: Olha, você jogar por dois clubes que disputavam a permanência na I Liga e receber um convite de um grande clube como o V. Guimarães, que disputa competição europeia... aceitei na hora! Devo muito ao Paços e ao Chaves o meu crescimento como atleta, e os adeptos deles tem meu carinho e respeito, mas o Vitória era uma grande oportunidade.

PC: O que mais destaca dos anos que passou em Guimarães?
RS: Clube grande, adeptos fantásticos, cidade belíssima. Joguei ao lado de jogadores consagrados. Fui muito feliz lá. Grandes jogos, grandes golos. Conquistei o respeito de todos lá. Classificámos todos os anos o clube para as competições europeias. Cumpri meu dever com o clube. Vitória me projetou para a Europa.

PC: E o Milovanovic era assim tão craque como se falava?
RS: Era diferenciado. Uma classe maravilhosa! Grande amigo que fiz. Eu acho que faltou mais oportunidade e sequência para ele jogar. Tinha concorrência grande lá, como o Vítor Paneira e outros. Cada treinador tem um esquema de jogo diferente. Os dois marcavam pouco, mas chegaram a jogar juntos. Dois talentosos sem dúvida nenhuma.

PC: Curiosamente no último ano em Guimarães foi quando fez mais golos, oito, e mesmo assim saiu para o... Braga. Os adeptos reagiram bem a esta troca?
RS: Sim, no meu último ano, o Professor Quinito me deu mais liberdade de atacar. Antes defendia mais, cumpria outras funções. Mas aprendi muito e cresci como jogador claro.
Apenas sai do Vitória porque o Paulo Autuori não ia contar comigo. Fiquei triste, os adeptos também. A vida é assim. Só saí por isso. Muitos adeptos  não acreditaram, pois saiu eu, o Edmilson, o Brandão. O ataque todo saiu, lembra?


PC: E o Braga era a melhor opção?
RS: Tive outros clubes, mas o projeto do Sp. Braga, naquele momento, era a melhor opção. Quero ressalvar aqui que a minha passagem no Braga foi fantástica também.

PC: O Braga naquela altura tinha muitos brasileiros de qualidade: Edmilson, Zé Roberto, Barata, Miran, o próprio Riva...
RS: Sim, verdade! Jogadores de alto nível que nos demos muito bem, dentro e fora do campo.

PC: E os 'grandes' de Portugal nunca o convidaram?
RS: Uma vez o Benfica, mas o Pimenta Machado não aceitou. Disse que me venderia para Itália, e aí nunca me disse porque não fez o negócio. Tem meu respeito, claro, mas era complicado lidar com ele.

PC: Jogou oito épocas em Portugal. Qual destaca como a sua melhor?
RS: Eu não gosto de dizer qual foi a melhor, porque todas foram o máximo. Cumpri todos os objetivos que tinha em cada uma delas. Mas o jogo te digo: Vitória x Parma, em Guimarães. Ganhámos 2-0. Foi lindo! Fiz um jogo fantástico, tal como toda a equipe.

PC: E golos? Quais recorda em especial?
RS: Todos golos que fazia contra FC Porto, Boavista, Sp. Braga... tinha sorte contra essas equipes. O mais bonito foi contra o FC Porto, no Vítor Baía.

PC: Quais os momentos da carreira que mais destaca?
RS: Positivos foi ter um sonho de ser jogador e fui, jogar no Cruzeiro, jogar na Europa, disputar competições europeias, conhecer o Mundo... enfim, desfrutar o que Deus me deu. 
Negativo foi machucar o joelho com 33 anos e não recuperar. Mas agradeço a Deus por tudo.

PC: Qual o defesa mais difícil que enfrentou?
RS: Fernando Couto.

PC: Que balanço faz da passagem por Portugal? Valeu a pena ter jogado cá?
RS: Foi uma passagem maravilhosa! Povo maravilhoso. Futebol de alto nível. Agradeço a todos treinadores, adeptos, jogadores que conheci. Muitos amigos que fiz! Minha carreira 90% foi feita em Portugal. Portugal tá na minha vida e no meu coração. Nada a reclamar de vocês, nada!

PC: Que momento mais divertido viveu em Portugal e quer partilhar?
RS: Rapaz, viajar para a ilha da Madeira era difícil, tinha medo! A malta ria de mim demais. Gostava de andar de avião, mas a pista lá era pequena...

PC: Neste momento é treinador e lidera a Riva Sports. Ambiciona treinar em Portugal? 
RS: Coloco tudo na mão de Deus. Estou preparado para tudo. Quem sabe treinar ou levar um jogador para Portugal... 
Quero aproveitar para enviar um abraço para todo o povo português!


A carreira de Riva, aqui.

Veja aqui, logo no início do vídeo, um golo de Riva, pelo V. Guimarães, ao FC Porto:


E aqui, por volta dos 2:35 do vídeo, um golo de Riva, pelo Sp. Braga, ao Boavista:

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Rui Ferreira


Rui Ferreira cumpriu sete épocas na I Liga e representou, por coincidência, três históricos do nosso futebol: Salgueiros, V. Guimarães e Belenenses.
Campeão da II Liga pelo Gil Vicente em 98/99, o antigo médio decidiu mudar-se para Vidal Pinheiro em busca da afirmação no futebol nacional e conseguiu-o: foram quase 200 jogos na I Liga em sete anos.
Foi Pimenta Machado quem o levou para Guimarães, e Rui Ferreira não defraudou minimamente as expetativas, visto que logo no primeiro ano na 'Cidade-Berço', ajudou o Vitória a ficar no quarto lugar do campeonato e consequente apuramento para a Taça UEFA.
Deixou a I Liga em 2006, quando saiu do Belenenses, e até terminar a carreira ainda representou Portimonense, Sp. Espinho e Santa Clara, por quem enfrentou o último grande desafio enquanto jogador: tentar subir à I Liga.
Rui Ferreira soma, também, dez internacionalizações por Portugal no escalão Sub-16, todas elas alcançadas enquanto jogador do Benfica, que o foi buscar ao Sp. Espinho na última fase da sua formação.
Atualmente com 43 anos, trabalha como comentador desportivo no Porto Canal e dirige a academia de futebol Marfoot, enquanto espera por um convite para voltar a treinar, já depois de ter orientado clubes como Boavista e Sp. Espinho.

Prémio Carreira: Campeão da II Liga pelo Gil Vicente, estreia-se na I Liga com a camisola do Salgueiros. Porquê esta mudança?
Rui Ferreira: Por uma razão muito simples: era um jovem com muita ambição, e o timing para chegar a um 'grande' começava a 'fugir'. Naquela altura, o Salgueiros era um clube que todos os anos ou quase todos os anos, vendia jogadores para clubes grandes, como o Deco para o FC Porto. E também porque era um clube perto do meu local de residência, pelo que apostei em ir para lá com a expetativa de chegar a um 'grande'. Foi mesmo uma aposta pessoal, porque se tivesse ficado no Gil Vicente até ia ser capitão.

PC: Recorda-se da estreia na I Liga?
RF: Sinceramente, não. Sei que antes de começar o campeonato, estava com muita expetativa e algum nervosismo, e com muita vontade em triunfar, mas do jogo em si que marca a estreia na I Liga não me recordo. [Com o Marítimo, em Vidal Pinheiro, vitória por 1-0.]

PC: Que balanço faz da sua passagem pelo Salgueiros?
RF: Faço um balanço positivo. Como disse, mudei-me para o Salgueiros com a expetativa de dar o 'salto' e apostei tudo na primeira época, que a nível coletivo não correu tão bem porque fizemos uma época fraca, mas a nível individual foi extraordinária, e no final da época o Boavista estava interessado em mim e no Pedrosa, mas acabou por contratar o Pedrosa. No meu último ano, descemos de divisão, num ano muito complicado, em que o Salgueiros começou a ter muitos problemas financeiros, tivemos troca de treinador, e o clube teve algumas falhas salariais para com alguns jogadores. Na altura, eu era sub-capitão e o João Pedro era o capitão, e fomos junto da direção pedir auxílio para alguns colegas nossos que estavam a passar por dificuldades. Resultado: acabámos afastados dos últimos oito jogos do campeonato, impossibilitados de dar o nosso contributo à equipa e de tentar ajudar o clube a manter-se na I Liga.
Tenho muito carinho pelo Salgueiros, e sei que esse carinho é recíproco, tanto da parte dos adeptos e da Alma Salgueirista, como da parte de pessoas que trabalhavam no clube na minha altura e que ainda hoje lá estão, pois às vezes vou ver jogos e sou sempre muito bem tratado.

PC: Do Salgueiros mudou-se para o V. Guimarães. Como surgiu essa possibilidade?
RF: De todos os jogos que fiz contra o Vitória, ganhei um admirador: o presidente Pimenta Machado. Como estava em fim de contrato com o Salgueiros e ele gostava muito da minha forma de jogar, decidiu contratar-me. Na verdade, dois anos antes já tinha tido a possibilidade de ir para Guimarães, com o mister Álvaro Magalhães, mas não se concretizou e acabou por servir de ponto de partida para o que veio a acontecer mais tarde. Mas tenho uma grande paixão tanto pelo clube como pela cidade. Posso mesmo dizer que fui "adoptado" pelos vimaranenses e pela cidade, e tenho lá pessoas que não considero como sendo minhas amigas, mas sim como se fossem da minha família.

PC: Em Janeiro de 2005 acaba por sair do Vitória sem ser por sua vontade, certo? O que se passou?
RF: Sim, certo. Foi uma fase de transição do clube. Saiu Pimenta Machado e entrou Vítor Magalhães, com outras ideias para o clube, naturalmente. As direções não se davam bem, e o Vítor Magalhães como queria estar rodeado por pessoas da sua confiança, decidiu mandar embora os jogadores que vieram com o Pimenta Machado. Como estava em fim de contrato e sabia que não havia interesse dele em que eu ficasse, surgiu o Belenenses ainda em Janeiro, e passado um ano de eu sair do Vitória, já não restava lá ninguém do meu tempo. Mas cada um tem as suas ideias, e temos que respeitar isso.

PC: E além do Belenenses, que outros convites teve?
RF: Penso que, na altura, o Beira-Mar interessou-se por mim, era o Luís Campos o treinador. Mas as razões que me fizeram optar pelo Belenenses são óbvias: é um dos 'grandes', tinha um bom treinador e uma boa equipa, em que 'só' para a minha posição haviam o Tuck e o Andersson, que era internacional pela Suécia. Mas felizmente correu-me bem a adaptação, o Andersson lesionou-se e eu consegui 'apanhar o comboio' e agarrar a oportunidade de ser titular, e nunca mais saí da equipa.
Mais tarde, indiquei alguns ex-colegas meus em Guimarães ao Belenenses, nomeadamente o Romeu e o Ivan Djurdjevic, porque se encaixavam nas ideias do clube, de ter jogadores com ambição e com valor não só futebolístico, mas também humano.

PC: No final da temporada 05/06, não só saiu do Belenenses, como se 'despediu' da I Liga. Não teve hipótese de continuar a jogar entre os 'grandes'?
RF: Com o Belenenses, foi uma situação normal de fim de contrato, e o clube não teve interesse em renovar. Da I Liga ainda tive o Estrela da Amadora, mas como estava numa fase muito difícil e não se decidia, optei por ir 'ajudar' o mister Diamantino Miranda, e assinei pelo Portimonense, da II Liga, também para não ficar muito tempo à espera e correr o risco de não ter clube. Em Portimão, apanhei o clube em ano de transição, entrou Fernando Rocha para a presidência, jogámos o ano todo no Estádio do Algarve e tivemos muitas dificuldades para ganhar jogos lá. No ano seguinte o clube viveu uma mudança muito forte, aproximou-se do FC Porto e recebeu alguns jogadores, e a meio da época vim para o Espinho, com a ideia de acabar a carreira no clube da minha terra, mas acabei por terminar a carreira no Santa Clara, que era orientado pelo Vítor Pereira e que estava numa fase de subida, e ele pediu para o ir 'ajudar' pois precisava de experiência. Infelizmente, ficámos 'pendurados' em Santa Maria da Feira na última jornada.


PC: Quais são os momentos da carreira que mais destaca?
RF: Pelo lado positivo, destaco o facto de ter jogado no Vitória de Guimarães, porque foi o clube que mais me marcou.
Pelo lado negativo, destaco o último ano que joguei no Salgueiros, pela razão que já referi anteriormente: por ter sido afastado dos últimos oito jogos, e por ter ficado impedido de ajudar os meus colegas e de exercer as minhas funções. Foi o momento mais negativo e doloroso que vivi no futebol, ainda por cima porque descemos e não pude ajudar a lutar pela manutenção.

PC: Fez sete temporadas na I Liga. Qual destaca como a sua melhor?
RF: Destaco a primeira que fiz no V. Guimarães, em 02/03, em que ficámos num magnífico quarto lugar. Foi uma época extraordinária tanto a nível individual como coletivo. Cheguei ao Vitória como sendo uma 'aposta' do Pimenta Machado e não do treinador, ganhei a titularidade na pré-época, e fiz 32 jogos no campeonato a jogar sempre a um nível muito elevado.
Mas também realço a primeira época que fiz no Salgueiros, pelo que já referi antes, e pelo simbolismo que teve por ser a estreia na I Liga.

PC: Fez 188 jogos na I Liga. Há algum que recorde em especial?
RF: Quando estava no Salgueiros, e jogámos contra o Sporting, naquele ano que o Sporting foi campeão ao fim de dezassete anos - em 2000 -, vivemos uma semana de loucos. Preparámos ao máximo esse jogo, até porque também precisávamos dele para não descer, mas os nossos planos saíram todos "furados", porque o relvado estava uma lástima. Falámos com os responsáveis do clube para melhorar o campo, mas eles disseram que era melhor o campo estar assim, porque os jogadores do Sporting eram melhores tecnicamente, e ia ser pior para eles. Mas não foi, porque ficou 4-0 (risos). E a primeira grande oportunidade do jogo até é nossa, não sei se pelo falecido Miklos Fehér ou pelo Paquito, mas penso que pelo Fehér, que quando vai a chutar, a bola bate num terrão e salta (risos). A primeira coisa que me veio à cabeça foram as palavras dos directores: ia ser melhor para nós, mas impediu-nos de tentar fazer golo primeiro que o Sporting (risos).
Também recordo um jogo no ano que subi pelo Gil Vicente, na Póvoa, contra o Varzim, que ganhámos por 4-0 e eu marquei um ou dois golos, não me lembro bem. Fizemos um jogo brilhante.

PC: E em quase 200 jogos, nem um golo. Há uma explicação para isso?
RF: Há, e é simples e verdadeira: antes de chegar à I Liga, no ano em que fui campeão pelo Gil, jogava principalmente a "oito" e fiz seis golos. Envolvia-me bastante nas jogadas ofensivas, participava nas bolas paradas ofensivas, etc. Mas quando cheguei à I Liga, todos os treinadores apostaram em mim para jogar a trinco, porque tinha um bom poder de colocação, boa leitura de jogo, era rápido, e mesmo sendo baixo, tinha um bom tempo de salto, pelo que eles não abdicavam de terem um jogador com estas características a defender nas bolas paradas, porque como era rápido podia fazer muitas dobras e recuperações, e a jogar a trinco não tinha grande envolvimento nos processos ofensivos. Esta é a razão com que me justifico, digamos assim.

PC: Jogou sete anos na I Liga e representou três históricos. Que significado tem isso para si?
RF: Significa orgulho, principalmente. Foram três clubes que aprendi a gostar, e onde fui sempre muito bem tratado e respeito. Aliás, fui bem tratado e respeitado por todos os clubes onde passei. Mas esses três são marcantes, claro. A certa altura cheguei a ter a ideia de fazer todo o resto da minha carreira no Salgueiros, mas entretanto o clube teve os problemas que teve e não deu. Pelo Vitória tenho uma paixão tremenda. A forma como fui tratado é incrível. O Belenenses é um clube de gente extremamente educada, infelizmente o presidente e o vice-presidente da altura já faleceram, mas eram pessoas de grande simpatia e educação. Acho que esse é um dos 'problemas' do Belenenses: falta mais agressividade num bom sentido, para que possam defender o clube de outra forma.

PC: Qual o melhor jogador que defrontou?
RF: Defrontei vários... Deco, por exemplo, fez dois anos magníficos no FC Porto e saiu para o Barcelona, naquela altura merecia ter sido eleito o melhor jogador do Mundo. Foi uma injustiça na minha opinião. Mas o que mais dificuldades me criava era, sem dúvida, o João Pinto. Eu no Deco 'encaixava' bem porque conhecia os movimentos dele, etc, mas o João não era bem um '10', era um '9 e meio', digamos. Fazia bastantes diagonais, movimentos nas costas da defesa, e naquela altura o trinco tinha sempre que andar atrás de um determinado jogador e calhava-me sempre o João, que era um 'saltitão' como eu lhe chamava. Desgastava-me imenso. Mas, curiosamente, nesses jogos era sempre eleito pelos jornais como o melhor jogador da minha equipa. Também apanhei o Mantorras na sua grande fase, no momento em que ele vinha fazendo furor. Recordo-me que foi um Salgueiros - Benfica, em Vidal Pinheiro, e eu fiz um jogo perfeito mesmo, porque ele vinha 'para cima' e eu não o deixava passar, ia atrás dele, fiz bastantes recuperações de bola, etc. No dia seguinte, num jornal até vinha "A arte de marcar Mantorras", ou coisa parecida.

PC: Que momento vivido no futebol quer/pode partilhar?
RF: Vivi um momento marcante quando jogava no V. Guimarães.
Na época 03/04, estivemos a lutar pela manutenção até ao fim, foi um ano muito confuso, o presidente Pimenta Machado foi ligado ao caso do "Saco Azul", o mister era o Jorge Jesus, e nós queríamos ter resultados, mas por uma ou outra razão, as coisas não saíam. Lembro-me que o mister estava há pouco tempo no clube e as coisas não estavam a correr de feição, por isso ele ia mexendo na equipa à procura das melhores soluções e a tentar que as coisas melhorassem. A dada altura, tivemos um jogo em casa contra o Gil Vicente, que perdemos por 2-0, e eu estava no banco. Com essa derrota caímos para a linha-de-água, e só conseguimos sair do estádio por volta da meia-noite, porque tinhamos a cidade toda à nossa espera para nos insultar (risos).
Na semana seguinte íamos jogar com o Marítimo, penso que logo na sexta-feira, e o Marítimo estava a fazer uma grande época. O mister nem queria dar treino, mas como seria o habitual treino de recuperação, com banhos e massagens, perguntou se dava para mudar o treino para o estádio. Mas o problema é que as banheiras de hidromassagem só existiam no complexo (risos). A maioria queria evitar ir ao complexo para não enfrentar os adeptos, mas eu fui um dos que se insurgiram contra isso, porque não achei correto, uma vez que os meus colegas precisavam de recuperar devidamente, e eu queria treinar para poder ser opção para o próximo jogo. Decidimos, então, treinar na segunda-feira de forma normal, no complexo. Quando lá chegámos de manhã, a verdade é que não estava lá ninguém para nos "chatear".
Começamos o treino, tudo normal, até que quando estamos a alongar, um senhor abriu uma porta que existe por trás de uma das balizas, e sentou-se junto ao poste da baliza a chorar e a pedir para darmos tudo para conseguirmos a manutenção, que preferia morrer a ver o Vitória descer de divisão. Nós estávamos a alongar dois a dois, eu estava junto com o Romeu, e lembro-me que as lágrimas vieram-nos aos olhos. Aí, quase que prometemos um ao outro que tinhamos de nos agarrar a tudo o que fosse possível, tinhamos que dar tudo por tudo, e custasse o que custasse, o Vitória tinha que sair daquela situação o mais rápido possível. Felizmente conseguimos a manutenção, e foi muito à base do grande grupo e espírito de equipa que existia no nosso balneário.

PC: Já foi treinador de Boavista e Sp. Espinho, mas neste momento é comentador desportivo no Porto Canal e dirige a Academia de futebol Marfoot. Por onde passam as suas ambições no futebol?
RF: Recentemente tirei o terceiro nível do curso de treinador, o chamado UEFA-A, e como tenho uma grande paixão pela área do treino, o meu objetivo passa por voltar a treinar. As oportunidades vão aparecendo e desaparecendo, ou porque a direção muda, ou porque surge um investidor com outras ideias, e só me resta esperar pela oportunidade certa. Até lá, vou vivendo a minha vida de forma tranquila, como comentador no Porto Canal e dirigindo a AC Marfoot, que está fixada em Silvalde (Espinho) e que, por enquanto, tem apenas escalões de futebol de sete.


A carreira de Rui Ferreira, aqui.

Veja aqui o resumo da carreira de Rui Ferreira em fotos:


E recorde aqui o célebre Salgueiros - Sporting de que Rui Ferreira fala:

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

João Paulo


João Paulo será, porventura, um dos jogadores que mais clubes representaram na I Liga: foram sete, divididos por nove épocas, num total de 140 jogos e 23 golos.
O antigo ponta-de-lança começou a fazer história no dia 26/07/1999, quando apontou o único golo da final do Euro Sub-18, que permitiu a vitória lusa sobre a Itália e consequente conquista do título.
Mais tarde, veio a estreia na I Liga ao serviço do Boavista e empréstimos sucessivos a clubes do escalão maior, antes da primeira experiência no estrangeiro.
Entre 2005 e 2013, foi alternando entre o estrangeiro e a I Liga, tendo passado por Tenerife, em Espanha, Rapid Bucareste, na Roménia, Olympiakos Nicosia e Apollon Limassol, no Chipre, e Khazar Lankaran, do Azerbaijão.
Em 06/07 ajudou o Paços de Ferreira a apurar-se para a Taça UEFA, feito que repetiria em 12/13, quando fez parte de um 'super Estoril', orientado por Marco Silva, que fez um belíssimo campeonato e terminou na quinta posição.
Na formação, foi Campeão Nacional de Juniores por duas ocasiões, ao serviço do Boavista, tendo somado 34 internacionalizações e 12 golos por Portugal, entre os Sub-15 e a Seleção B.
Atualmente com 36 anos, é delegado do Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol na zona Norte do País, e adquiriu recentemente o primeiro nível do curso de treinadores, pelo que o futuro passará, certamente, pelo futebol.

Prémio Carreira: Começo por lhe perguntar acerca do dia 26 de Julho de 1999...
João Paulo: Grande dia! É um dia que vai ficar sempre marcado na minha vida, não só como jogador, mas também na vida pessoal. Foi um golo importante e que fica para a história, ainda para mais porque deu um título europeu a Portugal, o que torna ainda mais marcante e prestigiante, pois conquistar um título por Portugal tem muita importância, obviamente.

PC: Apesar desse título, terminou a formação e foi emprestado, e só no terceiro ano como sénior teve a oportunidade de integrar o plantel principal do Boavista. Recorda-se da estreia na I Liga?
JP: Recordo, foi com o Varzim, na Póvoa, e curiosamente na temporada seguinte tornei-me jogador do Varzim.
Na altura, o Boavista era um grande clube, conhecido pela sua formação de qualidade, e optava por colocar os seus jovens jogadores a 'rodar' de forma a ganharem maturidade. Durante dois anos o clube decidiu, e decidiu bem, emprestar-me a clubes de II Liga, e percebo a importância que esses empréstimos tiveram, porque foram dois anos muito importantes para mim.
Depois quando regressei ao Boavista, é verdade que não foi um ano muito positivo em termos individuais, mas eram os "anos de ouro" do Boavista, a equipa era muito forte e fizemos uma campanha na Liga dos Campeões bastante positiva. Eu ainda era um 'miúdo', e apesar de não ter dado muito o meu contributo, aprendi bastante e fiquei, naturalmente, muito contente por ter feito parte dessa equipa.

PC: Nas três temporadas seguintes, seguiram-se três empréstimos sucessivos a clubes de I Liga - Varzim, Beira-Mar e Estoril. O que guarda de cada um deles?
JP: Penso que o importante na vida é tomar decisões. É melhor sermos nós a assumir, porque só depois é que se sabe se foi ou não a melhor opção que tomámos. E os empréstimos acontecem um pouco assim, porque tanto eu como o Boavista, achámos sempre que era a melhor opção.
No Varzim vivi um ano atípico. Foi um ano 'engraçado' para mim, digamos assim, importante para o meu crescimento, porque joguei fora da minha posição habitual - jogava a extremo-direito. Fizemos uma primeira volta fabulosa, lembro-me que na 'viragem' do campeonato estávamos no quinto lugar, e acabámos por descer. Foi o primeiro 'soco no estômago' que levei na minha carreira, porque acabou por ser um ano de insucesso, e custou bastante ver o clube descer, e sentir a tristeza dos meus colegas e dos adeptos.
Seguiu-se o Beira-Mar, e só posso dizer que adorei ter jogado lá. Adorei a cidade de Aveiro, e apanhei excelentes pessoas a todos os níveis: não só no plantel, como também na parte diretiva, e na parte da equipa técnica, que era liderada pelo mister António Sousa. E há também essa particularidade do meu primeiro golo na I Liga ter sido pelo Beira-Mar. Sei que atualmente está no Distrital, e é com muita pena minha que vejo o clube nessa situação.
No Estoril, apanhei um clube que vivia um período conturbado, por certas e determinadas razões que são do domínio público. Foi uma época muito difícil, numa fase em que o clube esteve perto de fechar as portas. Logo na pré-época saiu o mister Ulisses Morais, que tinha sido um dos responsáveis pelo crescimento do clube, veio o mister Litos, que apesar de não ter começado bem, conseguiu um grande resultado, que foi empatar no Dragão, diante de um FC Porto que tinha jogadores como Costinha, Diego, Luís Fabiano, Derlei, entre outros. Lembro-me que levámos um autêntico 'massacre', era normal que, a jogar em casa, o FC Porto tomasse conta do jogo e tivemos a sorte de conseguir aguentar o empate, com uma grande exibição do Jorge Baptista. Mas foi um ano positivo para mim, porque me permitiu a afirmação na I Liga no último ano de contrato que tinha com o Boavista.

PC: Em 2005 saiu para o Tenerife, mas a meio da época voltou a Portugal, para jogar no Paços de Ferreira. Porquê este regresso?
JP: Recordo-me que tinha várias propostas do mercado exterior, e optei por apostar num país onde o futebol é forte e é bem jogado, na minha opinião. Na altura tinha um empresário espanhol, o que também me influenciou de certa forma, e também tive em conta o facto de a Espanha ser 'logo aqui ao lado' e ser mais fácil a minha adaptação, porque era a primeira experiência que ia ter fora de Portugal. Sempre tive o objetivo de experimentar um campeonato fora, e apesar de em termos desportivos ter estado longe do que esperava, considero que foi uma experiência benéfica para mim.
O Paços, para mim, é um grande clube. Lembro-me que cheguei no último dia do mercado de Inverno, cheguei ao Porto já a meio da tarde de 31 de Janeiro, mas felizmente conseguiu-se a inscrição quase 'à última'. Aliás, nesse ano foi tudo 'à última', até a manutenção. À entrada para a última jornada, éramos a equipa que tinha menos possibilidades de descer, mas a combinação de resultados que estava a acontecer, aliada ao facto de estarmos a jogar com o Benfica, tornava a nossa tarefa ainda mais complicada. Estivemos a perder 1-0, mas demos a volta e ganhámos por 3-1, segurando assim a permanência.
Na época seguinte continuei no Paços, principalmente porque eu, no futebol, acredito em continuidade. E foi isso que demonstrámos na época seguinte, em que apesar de terem saído alguns jogadores importantes, entrámos para a história com a qualificação para a Taça UEFA, também conseguida na última jornada de um campeonato em que estivemos muito tempo sem perder em casa.

PC: Depois do Paços, seguiu-se o Leiria, onde em apenas meia temporada, era um dos melhores marcadores do campeonato e saiu em Fevereiro para o Rapid Bucareste, da Roménia. Que motivos o levaram a sair?
JP: Chego a Leiria depois de terminar contrato com o Paços, e foi com muita pena minha que saí, porque a passagem pelo Paços marcou-me imenso. São pessoas sinceras e honestas, que tinham interesse em manter-me, mas não excedem o seu teto salarial, ofereceram-me o máximo que podiam, mas a vida é assim mesmo.
Na União de Leiria, lembro-me que iniciámos muito bem a época, conquistámos a Taça Intertoto, e disputámos uma eliminatória com o B. Leverkusen na Taça UEFA, em que marquei nos dois jogos: lá perdemos 3-1 e em casa vencemos por 3-2. Individualmente foi bom, comecei a fazer golos, lembro-me que a meio da época tinha treze golos em todas as competições, cheguei a ser pré-convocado para a Seleção, e era o melhor marcador português do campeonato - com oito golos. Em Janeiro tive várias opções para sair, mas tinha uma cláusula de rescisão no valor de um milhão de euros, entretanto o mercado fechou, mas nos países de Leste continuava aberto. O Rapid veio-me observar num jogo contra a Académica, vencemos por 3-1, eu fiz dois golos, e aí eles deram o 'xeque-mate'. Pagaram a cláusula e ainda acrescentaram 250 mil euros por objetivos. Foi uma decisão difícil, porque o negócio foi feito muito rapidamente, estava a atravessar uma boa fase e sentia-me bem, e também porque o Leiria estava a passar por uma fase complicada e não queria deixar o clube naquela situação. Ao mesmo tempo, já tinha 27 anos, e sabia que ia ter poucas oportunidades para melhorar a minha vida de forma substancial, não só em termos económicos, mas também a nível de qualidade de vida e de outra experiência que ia viver. E claro, sabia que com a ida para a Roménia, a possibilidade de ser chamado à Seleção ia-se diminuir, mas optei por tomar a decisão de assinar pelo Rapid.


PC: Esteve na Roménia quase dois anos e voltou a Portugal, para jogar no Leixões. A que se deveu este regresso ao nosso País?
JP: Essencialmente porque começaram a surgir problemas financeiros na Roménia, tanto a nível de população como a nível de clubes. Ao mesmo tempo, comecei a ter problemas com o clube, devido ao incumprimento salarial, que chegou a ser de quatro meses. O clube teve uma proposta para me vender, mas recusou, e eu optei por forçar a saída, tanto que até já tinha apresentado queixa na FIFA devido aos salários em atraso.
Mesmo antes de rescindir, o meu desejo era voltar a Portugal, o Leixões manifestou interesse e eu aceitei. É um grande clube, vinha de uma temporada fantástica, mas naquele meio ano começaram-se a sentir algumas fraquezas, e acabámos por descer. O clube manifestou interesse em mim para a época seguinte, mas como não queria jogar na II Liga e o próprio clube vivia dias instáveis, decidi sair. Mas tenho muito carinho pelo Leixões e pela sua massa associativa, gostei imenso de jogar no Leixões, e posso dizer que é um clube que me marcou.

PC: Volta a emigrar, primeiro para o Chipre, e depois para o Azerbaijão. Foram boas decisões?
JP: O Chipre foi, sem dúvida, uma boa decisão. É um país onde o jogador português é muito bem recebido e acolhido, nunca tive problemas. Primeiro joguei no Olympiakos Nicosia, e foi uma época que em termos pessoas correu muito bem, fiz muitos golos, e sentia-me praticamente em casa porque tinha muitos colegas portugueses. No final da época o Omonia quis contratar-me, os clubes chegaram a acordo, mas eu não me entendi com o Omonia. Depois apareceu o Khazar Lankaran, do Azerbaijão, eu aceitei e eles pagaram a cláusula de rescisão. Mas foi a pior experiência da vida. Por vezes na vida temos de fazer reflexões, e eu fiz a minha, e foi um daqueles casos em que chegámos rapidamente à conclusão de que o dinheiro não é tudo. Tentei a sorte com um contrato muito bom, mas, imagine-se, iniciámos a pré-época, fizemos cinco treinos, e fomos a Israel disputar uma pré-eliminatória da Liga Europa, com o Maccabi Haifa, que perdemos por 3-1. A maior parte das equipas azeris ficam hospedadas em Baku, que é uma cidade fantástica, enquanto que Lankaran é, com todo o respeito, uma aldeia. Uma aldeia com muita gente, digamos (risos). Era muito difícil encontrar alguém que falasse inglês, eram pessoas muito fechadas, e chegávamos a ficar cinco ou seis dias em Baku, e só íamos a Lankaran jogar. O dono do clube fez um centro de estágio enorme, com estádio, campos de treino, piscina, hotel, etc. Aquilo mais parecia uma mini-cidade (risos). E depois houveram semanas em que ficávamos cinco ou seis dias nesse complexo, estávamos muito tempo 'fechados', e essa foi uma das razões que me fizeram ver que dinheiro não é tudo. E outro dos motivos que me fizeram querer ir embora rapidamente foi que alguns colegas brasileiros ausentaram-se do País por uns dias, e quando quiseram regressar não os deixavam, e como eu digo "nas costas dos outros vemos as nossas", e pensei que me poderiam fazer igual, pelo que pedi para sair, e claro que eles não ficaram contentes, porque tinham pago o meu passe, tinha dois anos de contrato, mas entretanto surgiu o Apollon Limassol, e eles aceitaram emprestar-me.

PC: Rescinde com o Khazar Lankaran e torna-se jogador do Estoril. Era a melhor opção?
JP: Sim, foi a melhor, sem dúvida. Tinha jogado lá uns anos antes e sentia-me em dívida para com o clube, porque tínhamos descido de divisão e não fizemos uma boa temporada. Quando o Mário Branco, que era o diretor-desportivo, me convidou, aceitei de imediato, porque já tinha 32 anos e sabia que não ia ser fácil regressar à I Liga. Regressei com grande satisfação, e tive um regresso feliz a um clube que estava completamente diferente do que era uns anos antes. Fizemos uma grande época, em qualquer estádio que jogássemos, jogámos sempre da nossa forma, sem medos, e fizemos muito bons jogos. O Estoril vinha da II Liga e ficou em quinto lugar, garantiu o apuramento para a Liga Europa, e isso fica para a história. O Marco Silva demonstrou e continua a demonstrar que é um grande treinador. A nível pessoal não correu muito bem, porque tive uma lesão em Janeiro que se arrastou até ao final da época, e nós nunca esperámos este tipo de coisas. Mas penso que, dentro de um grupo de trabalho, somos todos importantes, cada um à sua maneira, e eu sinto que também fui importante.

PC: Fez nove épocas na I Liga. Qual a sua melhor?
JP: Estatisticamente foi na União de Leiria. Penso que foi a época em que fiz mais golos no campeonato, logo em termos de números foi essa. Mas em termos coletivos, destaco as épocas no Boavista, no Paços de Ferreira e no Estoril.

PC: Ser campeão da Europa Sub-18 por Portugal foi o momento mais alto da sua carreira?
JP: Sim, foi. Até porque aconteceu na última fase da formação e acredito que foi importante para mim a nível de carreira, porque dei-me a conhecer e, se calhar, falou-se mais do João Paulo.

PC: O que falhou na sua carreira?
JP: Não é que tenha falhado algo... Há sempre margem para melhorarmos.
Mas a minha carreira foi como foi, estou extremamente contente pelo que fiz, e o percurso que fiz enquanto futebolista deu-me tudo o que tenho até hoje. Fiz muitas amizades, nunca prejudiquei ninguém para alcançar os meus objetivos, e isso também é importante, porque todos temos que seguir o nosso caminho sem prejudicarmos os outros.

PC: Qual o melhor golo que fez?
JP: O mais importante é óbvio, o que marquei à Itália na final do Euro Sub-18.
O melhor... julgo que também pela Seleção, nos Sub-20, diante da Turquia, no Torneio Internacional da Madeira. Virei-me de frente para o central, fiz-lhe uma 'cueca', e depois de o ultrapassar fiz um remate fortíssimo ao ângulo, nem eu sabia que chutava tão de força (risos). Infelizmente naquela altura não havia a facilidade que há hoje de se filmarem os jogos, mas fica na minha memória e na memória de quem lá esteve.

PC: Sendo o João Paulo ponta-de-lança, qual o melhor defesa-central que defrontou?
JP: Foram alguns. Ricardo Carvalho pela qualidade que sempre demonstrou, Ricardo Costa que foi meu colega na formação do Boavista e acho que uma vez até me partiu o nariz (risos), o Pepe que considero ser um dos melhores centrais de sempre, o André Cruz que jogou no Sporting, pela qualidade que tinha, entre outros...

PC: Que história ou momento caricato vivido no futebol, quer partilhar?
JP: Curiosamente, quando terminou o empréstimo ao Apollon Limassol e voltei ao Khazar Lankaran, estava decidido que não ficava no clube, mas fui fazer a pré-época até que a situação estivesse resolvida. Entretanto, o clube mudou de treinador, veio um treinador azeri, que falou comigo, disse que sabia da minha história, mas que contava comigo e queria que eu ficasse. Eu naturalmente agradeci-lhe o interesse, mas disse que não queria ficar. Estávamos a fazer a pré-época na Áustria, e qual não é o meu espanto quando no primeiro jogo de treino, ele me coloca a jogar a titular. Eu joguei sem problemas, e como é pré-temporada, estamos sempre mais relaxados em campo, mas, mesmo assim, fiz três golos. Quando acabou o jogo pensei logo "agora é que dei cabo da minha vida" (risos). Mas felizmente acabei por sair a bem.

PC: Atualmente é delegado do Sindicato de Jogadores e recentemente tirou o primeiro nível do curso de treinadores. Quais são as suas ambições para o futuro?
JP: O convite para integrar a equipa do Sindicato lisonjeou-me bastante, porque sempre me identifiquei com a sua política de ajudar sempre o jogador, e também me ajudou algumas vezes, pelo que decidi aceitar o convite para ser o responsável pela zona Norte.
Como costumo dizer, eu não faço planos para o futuro, precavenho-me para ele. Há um ditado que diz "o saber não ocupa espaço" e quero ter conhecimentos em muitas vertentes. É normal que há aquela saudade do dia-a-dia de uma equipa de futebol, de sentirmos a relva, e claro que queremos todos continuar ligados ao futebol, mas, essencialmente, vou-me formar para que um dia, se aparecer uma oportunidade, não tenha que rejeitar por não estar preparado.


A carreira de João Paulo, aqui.

Veja alguns dos melhores momentos da carreira de João Paulo:



quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Gama


Gama formou-se no Sp. Braga, mas foi no Rio Ave que construiu a sua carreira e ganhou "raízes".
Nome incontornável da história do clube de Vila do Conde, chegou lá pela primeira vez em 1992 e, volvidos vinte e quatro anos, ainda está ao serviço do clube verde-e-branco: foram quinze anos como jogador e já vão nove como treinador-adjunto da equipa principal.
Curiosamente, o verde-e-branco está marcado na vida do antigo avançado logo desde o início da carreira, ou não tivesse a sua estreia na I Liga sido diante do V. Setúbal, com a camisola do Sp. Braga, e quando ainda era júnior.
Entre 1987 e 1992, fez 22 jogos pelos minhotos na I Liga e marcou um golo, com um empréstimo ao Fafe pelo meio. Depois, rumou a Vila do Conde envolvido na saída de Toni para Braga, e foi lá que fez praticamente toda a sua carreira, com 206 jogos e 14 golos na I Divisão.
Ao serviço do Rio Ave, subiu duas vezes à I Liga, chegou às Meias-Finais da Taça de Portugal, e esteve presente na segunda volta sensacional que o clube fez em 96/97.
Foi, ainda, dez vezes internacional por Portugal entre os Sub-18 e Sub-21.
Aos 46 anos é, como já se disse, adjunto do Rio Ave desde 2007, altura em que colocou um ponto final na carreira, marcada, claro está, por quinze épocas consecutivas ao serviço dos vilacondenses.

Prémio Carreira: Era júnior quando foi lançado na I Liga, pelo Sp. Braga, na época 87/88. Recorda-se da sua estreia?
Augusto Gama: Sim, recordo. Entrei contra o V. Setúbal, em casa, e empatámos 2-2. O nosso treinador era o Manuel José, e o Braga tinha jogadores que eram grandes referências como Laureta, Jorge Gomes, Carvalhal, entre outros. E é claro que senti uma grande emoção em estrear-me na I Liga, em pleno Estádio 1º de Maio, perante os sócios do SC Braga.

PC: Até 1992, com um empréstimo ao Fafe pelo meio, nunca conseguiu ter verdadeiramente uma oportunidade para se fixar no Braga. Na sua opinião, o que falhou para não ter tido hipótese de se afirmar no 1º de Maio?
AG: No meu caso, penso que faltou ter uma sequência de oportunidades para jogar. Dou o exemplo de quando estive em Fafe, em que era jovem e tive essa sequência de oportunidades, e consegui impôr-me. Naquela altura, não era fácil um jovem ter muitas oportunidades, e o Sp. Braga vivia uma fase intranquila, precisava de resultados, e quando os clubes não estão bem, não arriscam em lançar jovens.

PC: Precisamente em 1992, saiu para o Rio Ave, que jogava na II Divisão de Honra. De todos os convites que teve, era a melhor opção? 
AG: Recordo-me que sai para Vila do Conde juntamente com o Barroso, em virtude do Toni, que era um ponta-de-lança cabo-verdiano, ter ido para o Sp. Braga. A diferença é que eu saí em definitivo e o Barroso foi emprestado. Tive outras propostas, mas a do Rio Ave foi a melhor que apareceu, tanto para mim, como para o Sp. Braga.

PC: Quando se estreou na I Liga pelo Rio Ave, em 96/97, o clube fez uma péssima primeira volta e uma espetacular segunda volta. O que mudou? Quais foram os "segredos"?
AG: O essencial foi tirarem-nos a pressão. Chegámos a uma altura em que a "obrigação" de ganhar deixou de existir, porque assumimos praticamente a descida de divisão. Quando ganhámos o primeiro jogo sentimos uma grande alegria, voltamos a unir-nos, e fomo-nos superando a cada jogo que fazíamos. O Rio Ave estava há muitos anos sem jogar na I Divisão, tínhamos jogadores com pouca experiência e havia muita pressão para garantirmos a manutenção. Praticamente fizemos o inverso do Espinho: tinhamos 7 pontos na primeira volta e acabámos com 35; e eles acabaram a primeira volta em quarto lugar com 27 pontos e descerem de divisão com 33. Essa permanência era, sem dúvida, algo impensável.

PC: Jogou quinze temporadas no Rio Ave, sete na Primeira Liga e oito na Segunda. Com certeza teve convites para sair. Por que razão nunca saiu?
AG: Essencialmente porque sempre me senti bem em Vila do Conde. Ainda apanhei aquela altura em que os clubes tinham a "carta" dos jogadores e não os deixavam sair a qualquer proposta que houvesse, tinha que ser mesmo uma proposta fora do normal. Mas o Rio Ave é um clube especial, um clube familiar, que proporciona todas as condições de trabalho a quem lá está. Naturalmente que tive várias propostas para sair, uma delas foi do Vasco da Gama do Brasil, que era treinado pelo Abel Braga, que já tinha sido meu treinador no Rio Ave, mas não houve acordo, e outras da I Liga, que fui rejeitando por opção minha. Mas não me arrependo de não ter saído.


PC: Quais são os momentos da sua carreira que mais destaca?
AG: Momentos positivos destaco as duas subidas pelo Rio Ave, em 95/96 e 02/03, e a recuperação que falámos anteriormente, em 96/97. Após o jogo em que garantimos a manutenção, na chegada a Vila do Conde, o autocarro não conseguia passar a ponte, porque estavam centenas de pessoas à nossa espera, e é um momento inesquecível para quem o viveu.
Os momentos negativos são as descidas de divisão pelo Rio Ave, em que ficámos sempre tristes tanto por nós como pelo clube que representámos porque não conseguimos os objetivos. E destaco também a chegada às Meias-Finais da Taça de Portugal em 99/00, em que estivemos perto de cumprir o sonho de ir ao Jamor, mas acabámos eliminados pelo FC Porto.

PC: Fez onze temporadas na I Liga. Qual foi a sua melhor?
AG: Sem dúvida a de 03/04, porque foi uma grande época não só da minha parte, como também da equipa. Praticávamos um futebol de muita qualidade, tinhamos um excelente grupo, e batemos nesse ano o recorde de pontos do Rio Ave na I Liga - 47. Curiosamente só na época passada é que esse recorde foi ultrapassado.

PC: Nessas onze épocas, fez 206 jogos e apontou 14 golos. Há algum jogo que recorde em especial?
AG: Sim, há dois: o jogo que nos garantiu a tal permanência na I Liga em 96/97; e um Varzim - Rio Ave, penso que em 97/98, que ganhámos 3-1, com golos de Emanuel, Quinzinho e Luís Coentrão, e que os adeptos ainda hoje se lembram e falam.

PC: E golos? Qual o golo na I Liga que não esquece?
AG: Não esqueço o golo que marquei ao Estrela da Amadora, em 02/03, que até foi na II Liga, mas que nos garantiu a subida de divisão. Dos que marquei na I Liga, recordo-me de um contra a Académica em 04/05, em que fiz um chapéu ao Pedro Roma, e ganhámos esse jogo por 3-1. Marcava poucos golos, mas diria que 90% dos golos que marquei foram de belo efeito.

PC: Sendo o Gama avançado, qual o defesa mais duro que apanhou? Ou aquele que era mais difícil de ultrapassar?
AG: Apanhei bastantes... Mas destaco o Bruno Alves, que era um jogador agressivo, e atleticamente muito forte, e que era muito difícil de ultrapassar, mesmo quando estava a iniciar a sua carreira, primeiro no Farense e depois no V. Guimarães.

PC: Certamente que ao longo da sua carreira, presenciou vários momentos divertidos. Há algum que se lembre e que possa contar?
AG: Uiii, são tantas histórias (risos). Recordo-me de um episódio que ocorreu no final de um treino no Rio Ave, em que estava a beber água juntamente com o Zé Gomes, e havia um colega nosso que usava um "pivot" dentário e que na altura em que ele estava a beber água, esse mesmo "pivot" soltou-se e ficou-lhe preso na garganta. Ele muito aflito começou a dizer "Gama não consigo respirar", e o Zé Gomes chamou o massagista que estava do outro lado do campo. Entretanto, eu dei um solavanco nas costas desse nosso colega e aquilo saiu-lhe. O massagista quando chegou, perguntou o que se estava a passar, e o Zé disse "foi ele que engoliu o aparelho", e ele pergunta "qual aparelho?", então o Zé, enervado, responde-lhe "olha, foi o aparelho da música" (risos).

PC: Desde 2007 trabalha como adjunto da equipa sénior do Rio Ave. É nessa função que quer continuar a estar ligado ao futebol ou gostava de ter outras?
AG: Eu sinto-me feliz só de estar ligado ao futebol, porque o futebol é a minha vida e algo que me dá prazer. Naturalmente que todos temos ambições, mas o que eu quero e gosto mesmo é de estar ligado ao futebol e ao Rio Ave.


A carreira de Gama, aqui.

Veja aqui, por volta dos 2:10 do vídeo, um golo de Gama ao Sporting:


Aqui, por volta do minuto 1:15, uma assistência de Gama diante do Benfica:


E o golo de Gama à Académica, aqui.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Zé Nando


Formado no Penafiel e contratado pelo FC Porto, seria no Paços de Ferreira que Zé Nando teria a oportunidade de singrar na I Liga.
Nas Antas nunca lhe deram a oportunidade de integrar o plantel principal, e emprestaram-no sucessivamente durante três épocas: ao Leça, ao Gil Vicente e ao Paços de Ferreira.
Ao longo de quatro anos, o antigo defesa-esquerdo ajudou os pacenses a consolidarem-se na I Liga, com boas épocas, boas classificações e com vitórias sobre todos os "grandes".
Em 2004, Zé Nando transferiu-se para o Vit. Guimarães, e encerrou aí um ciclo de seis temporadas consecutivas ao mais alto nível, rumando depois ao Chipre, onde esteve três anos.
Terminada a experiência por terras cipriotas, resolveu voltar a casa para acabar onde tinha começado: no Penafiel, que ajudou a subir da II Divisão B para a II Liga.
Com 128 jogos na I Liga, Zé Nando teve o reconhecimento do nosso País quando foi chamado para representar Portugal, por quem soma duas internacionalizações na Seleção B, e esteve, ainda, pré-convocado para a Seleção A.
Atualmente com 41 anos, é diretor-desportivo do Penafiel há cinco temporadas, e é nesta função que pretende continuar no futuro.

Prémio Carreira: Indirectamente chega à I Liga pela mão do FC Porto. Como surgiu a oportunidade de se mudar para as Antas?
Zé Nando: Surgiu depois de fazer os primeiros cinco anos como profissional no Penafiel, na Segunda Liga, e em 1998, tive a oportunidade de assinar a custo zero pelo FC Porto. Assinei contrato de quatro épocas, mas fui sempre emprestado: primeiro ao Leça, depois ao Gil Vicente e por último ao Paços de Ferreira, com quem acabei por assinar em definitivo, em virtude da saída do Rafael para as Antas. Quando assinei com o FC Porto, ainda pude fazer a pré-época com a equipa principal, na altura no primeiro ano do mister Fernando Santos, mas acabei emprestado ao Leça, que ia jogar na I Liga, e acabou por ser despromovido na secretaria.

PC: Em 99/00 estreou-se na I Liga pelo Gil Vicente. Recorda-se da estreia?
ZN: Sinceramente, não (risos). [Em Barcelos, com a União de Leiria.]

PC: Essa época esteve longe de ser positiva para si. O que se passou para ter jogado tão pouco?
ZN: Na altura, o treinador tinha outras opções que, naturalmente, custavam a entender, porque achava que tinha mais qualidade e capacidade para jogar regularmente. Recordo-me que em Dezembro pedi à direção para sair, mas não deixaram, e acabei depois por estar cerca de três meses sem sequer entrar na ficha de jogo, pois ou não era convocado ou ia para a bancada.

PC: Depois mudou-se para o Paços de Ferreira. Era a melhor opção? 
ZN: Sim, era. Primeiro porque o Paços me apresentou um projeto interessante, e segundo porque o mister José Mota insistiu bastante comigo, ligava-me todos os dias, e isso acabou por pesar bastante para mim, porque sabia que ia ter a oportunidade de poder jogar com regularidade.

PC: O Paços foi o clube mais importante na sua afirmação?
ZN: Acabou por ser, porque foi o clube que me deu a oportunidade de me poder dar a conhecer, digamos assim. Fui chamado à Seleção B enquanto jogador do Paços, e estive, depois, pré-convocado para a Seleção A, num lote de trinta jogadores. Também foram anos muito bons para o clube, que fez boas campanhas, ganhou aos três "grandes", obteve boas classificações e afirmou-se na I Liga. Recordo-me que nas três primeiras épocas melhorámos sempre a nossa classificação: 9º lugar em 00/01; 8º em 01/02; e 6º em 02/03.

PC: Em 2004 saiu para Guimarães. Porquê o Vitória?
ZN: O Vitória era um namoro antigo (risos). Puxando a "cassete" atrás, já tinha tido a possibilidade de jogar no Vitória anteriormente, mas o Paços não deixou, porque me considerava inegociável. Tanto que o Benfica também me quis contratar, e o clube rejeitou a oferta. Depois, no meu último ano em Paços, estava em fim de contrato, apareceu o Vitória e aceitei.

PC: O que falhou para ter sido pouco utilizado?
ZN: Falhou, se calhar, ter mais oportunidades para jogar, apenas isso. Apesar de não ter jogado muito, era quase sempre convocado, e considero que foi uma boa época, pois tinhamos um plantel forte, e conseguimos o apuramento para a Taça UEFA. E para a minha posição a outra alternativa era o Rogério Matias, que chegou a ser chamado à Seleção nesse ano.


PC: Quando saiu de Guimarães, rumou a Chipre onde esteve três anos. Como surgiu esta possibilidade e como foi a experiência?
ZN: Primeiro fui convidado pelo clube, AEK Larnaca, a visitar as suas instalações e o País sem assinar qualquer compromisso. Como gostei do que vi, resolvi aceitar o convite. E muito sinceramente, nunca pensei ter espírito de emigrante, porque vamos conhecer uma realidade à qual não estamos habituados e vamos sem preparação nenhuma, digamos assim. Estamos longe da família, dos amigos, etc, e isso pesa bastante.
Mas gostei bastante dos três anos que lá estive. As coisas correram bem a todos os níveis, o AEK tinha um projeto interessante, estava-se a afirmar, e logo no primeiro ano chegamos à final da Taça, mas acabámos por perder no prolongamento. Ainda joguei mais um ano no AEK e depois sai para o AEL Limassol, que é um histórico do Chipre e que tem uma massa adepta um bocado nervosa (risos). É gente que vive o futebol de forma diferente da nossa, e posso dizer que vi situações impensáveis de acontecer por cá.

PC: A chamada à Seleção é momento mais alto da sua carreira?
ZN: Sim, sem dúvida. Até porque representava o Paços de Ferreira, que, naquela altura, não tem o reconhecimento que tem hoje. E quando estive pré-convocado para a Seleção A, o clube chegou a ter três jogadores nesse lote: eu, o Mário Sérgio e o Zé Manuel. Para um clube daquela dimensão era um grande feito.
Mas também destaco o momento em que assinei pelo FC Porto, pois jogava na II Liga e ter a possibilidade de representar um clube de "top" como o FC Porto, é uma coisa que toda a gente deseja.

PC:  O que faltou na sua carreira?
ZN: Faltou jogar num "grande". É verdade que tive a oportunidade de jogar no FC Porto, mas não a consegui agarrar, se calhar, também por causa de alguma inexperiência. E ainda houve a possibilidade de jogar no Benfica, mas o Paços, como disse, não aceitou a proposta.

PC: Tem mágoa por não ter jogado com o Penafiel na I Liga?
ZN: Sim, tenho uma ligeira mágoa, claro. Ainda houve uma abordagem na altura em que o clube esteve na I Liga entre 2004 e 2006, mas acabou por não se concretizar.

PC: Fez seis épocas na I Liga, qual foi a melhor?
ZN: Destaco as três primeiras que joguei em Paços, pelas razões que já mencionei: boas classificações, vitórias contra os "grandes", a pré-convocatória para a Seleção, etc.

PC: De que jogos guarda mais memórias?
ZN: Tenho alguns jogos marcantes, mas aqueles que ficam mais na memória são, naturalmente, os jogos contra os "grandes". E, felizmente, ganhei a todos eles: no meu primeiro ano fomos à Luz ganhar por 3-2, em que faço a assistência para o primeiro golo, se não estou em erro, e ajudámos o Paços a vencer na Luz pela primeira vez na sua história; nesse mesmo ano vencemos o FC Porto em casa, por 1-0, em que aos 89' minutos há um canto contra nós, eu estou ao segundo poste, ganho a bola, arranco, cruzo para a área, e o Leonardo faz golo. Recordo-me que estava a chover bastante, havia muita lama, e o campo estava impraticável. E contra o Sporting, em 02/03, vencemos em casa por 4-0, e fiz uma assistência nesse jogo também.

PC: Qual o extremo mais difícil que teve de marcar?
ZN: Foram alguns... Capucho, Quaresma, Simão Sabrosa. Todos com características diferentes, mas com muita qualidade, e difíceis de marcar.

PC: Que história vivida no futebol pode partilhar?
ZN: Estou-me a recordar de algumas histórias que são engraçadas, mas que não se podem contar (risos).

PC: É diretor desportivo do Penafiel. É nesta função que se pretende manter dentro do futebol no futuro ou gostava de ter outras?
ZN: Estou nesta função há cinco anos, mas primeiro comecei como treinador-adjunto. Neste momento, o meu objetivo passa por melhorar os meus conhecimentos nesta função e ajudar o Penafiel a atingir os objetivos propostos para a época atual. Quanto ao futuro, gostava de chegar o mais longe possível como diretor-desportivo, se for no Penafiel, melhor, mas se surgir a oportunidade de representar outro clube e que me permita atingir um patamar superior, não vou recusar.


A carreira de Zé Nando, aqui.

Veja por volta do 1:35 do vídeo, a arrancada de Zé Nando contra o FC Porto:


Veja neste vídeo a assistência de Zé Nando para o quarto golo do Paços frente ao Sporting:

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Ramires


Lançado pelo Vitória de Guimarães na I Liga, Ramires haveria de "marcar posição" no principal palco do futebol luso ao serviço do Alverca, clube que representou durante oito anos.
No Ribatejo, Ramires não só teve a oportunidade de se afirmar na I Liga, como ajudou o clube a subir de divisão por duas vezes.
Formado no Sporting e internacional por Portugal em todos os escalões jovens, o antigo extremo nunca foi aposta do clube de Alvalade, e um ano depois de ter saído para Guimarães como uma das "moedas de troca" por Pedro Barbosa e Pedro Martins, despertou o interesse do Benfica, clube com quem teve contrato durante cinco anos, e que o emprestou sempre ao Alverca.
Em 2004 o Alverca deixou a I Liga e Ramires seguiu igual caminho, de nada valendo os 132 jogos e 17 golos em seis temporadas ao mais alto nível.
Ainda vestiu as camisolas encarnadas do Santa Clara e do Imortal, até rumar a Espanha, para representar o Zamora, que jogava, então, na II Divisão B. A essa experiência, seguiram-se cinco temporadas no Luxemburgo, quatro no Hamm Benfica e uma no Kayl Tétange, antes de terminar a carreira.
Atualmente com 40 anos, a máxima ligação que o antigo futebolista tem com o futebol, é o facto de representar os Veteranos do Benfica, mas não esconde que gostava de voltar ao "desporto-rei" noutras funções.

Prémio Carreira: Estreia-se na I Liga, ao serviço do V. Guimarães, emprestado pelo Sporting. Que motivos o levaram a aceitar mudar-se para a "Cidade Berço"?
Ricardo Ramires: Sim, é verdade, estreei-me na I Liga ao serviço do V. Guimarães, mas não fui emprestado ao V. Guimarães pelo Sporting. Fui cedido a título definitivo, juntamente com o Capucho, o Edinho e o Arley, envolvidos no negócio do Pedro Martins e do Pedro Barbosa. Inicialmente era para assinar por três épocas com o V. Guimarães, mas só cheguei a acordo por uma época.

PC: Pelo Vitória, no campeonato, faz apenas dois jogos como suplente utilizado. Recorda-se da sua estreia na I Liga? O que correu mal para ter jogado tão pouco?
RR: Claro que me recordo da minha estreia na I Liga: foi contra o Tirsense. Foi um dia muito especial e que me marcou para sempre, pois tinha realizado um dos meus sonhos em termos Profissionais, que era jogar na I Liga. Foi, de facto, um dos dias mais felizes da minha vida.
Acho que não correu mal, o 'problema' é que tinha no meu lugar só dois dos melhores extremos direitos do futebol Português naquele momento: o Vítor Paneira e o Capucho. E eu, com 19 anos, tinha muito que aprender, mas fui quase todos os jogos convocado, fruto de muito trabalho nos treinos. Aprendi muito nesta época, pois tínhamos um plantel de grande qualidade, tínhamos uma grande equipa e fomos com naturalidade à Taça UEFA.

PC: No final dessa temporada, 95/96, um ano depois de ter deixado de ser jogador do Sporting, torna-se jogador do Benfica. Como é que surgiu esta possibilidade?
RR: Naquele momento, o meu empresário era o Sr. José Veiga, e no final da época fui convocado para os Sub-21, que iam disputar o Torneio de Toulon, e como a minha prestação foi excelente, surgiu o interesse do Benfica. Tinha, também, a possibilidade de renovar contrato com o V. Guimarães, mas optei por assinar pelo Benfica, porque o Benfica naquela época não tinha nenhum extremo direito.
Fui o primeiro jogador a utilizar a Lei Bosman em Portugal.

PC: Durante os cinco anos de contrato que teve com o Benfica, esteve sempre emprestado ao Alverca. Nunca lhe justificaram o porquê de não apostarem em si?
RR: Não. Na primeira época fiz parte do plantel principal do Benfica durante cinco meses, e o meu empréstimo ao FC Alverca começa em Janeiro dessa época.
Nas quatro épocas e meia que tive emprestado pelo Benfica ao Alverca, fui um dos jogadores com mais produtividade e rendimento na equipa, com a realização de excelentes épocas e nunca me foi dada a oportunidade de fazer uma pré-época. Só realizei uns jogos amigáveis pelo Benfica contra Real Madrid, Gil Vicente e outras equipas mais, e a minha prestação foi sempre muito positiva, cheguei mesmo a marcar o golo da vitória contra o Gil Vicente. Depois desse jogo, renovei contrato com o Benfica e fui novamente emprestado ao Alverca, e os responsáveis do Benfica daquela altura nunca me chamaram para conversar.
O porquê não sei, só os responsáveis do Benfica dessa altura é que podem responder a essa questão.

PC: Jogou oito anos no Alverca, cinco deles na I Liga. O Alverca foi o clube mais importante na sua afirmação como jogador profissional?
RR: Sim, sem dúvida. Foi o clube onde vivi os melhores momentos da minha carreira. Mas quero também ressalvar a importância do Sporting, que foi o clube que marcou a minha carreira, pois foi onde fiz toda a minha formação, e onde aprendi o mais importante para ser profissional de futebol, a par dos tempos que passei na Seleção. Foram cinco épocas de formação e uma de sénior emprestado ao Torreense, cheguei a ser Capitão dos Juniores do Sporting, aos 17 anos estreei-me nos seniores, no campeonato de Reservas contra o Olivais e Moscavide, e até marquei um golo. Fiz jogos amigáveis pelos seniores e cheguei a fazer treinos com a equipa principal, e se o mister Bobby Robson não é despedido, eu ia fazer parte do plantel principal do Sporting com 18 anos, mas, depois, com a chegada do mister Carlos Queiroz, fui emprestado ao Torreense.
Tudo o que fui como profissional de futebol e, o que sou como Homem, devo tudo ao Sporting.


PC: Que recordações e momentos guarda do tempo que lá viveu?
RR: Foram momentos de grande nostalgia que já mais esquecerei. Eu, juntamente com toda a estrutura do FC Alverca, os treinadores e os meus colegas, que eram grandes jogadores, conseguimos formar várias equipas de grande nível, com grandes resultados. Em termos de vitórias, só não conseguimos ganhar ao FC Porto, de resto, a todas a outras equipas do campeonato conseguimos ganhar nas cinco épocas que estivemos na I Liga e, dado à dimensão do clube, conseguimos marcar o FC Alverca no futebol Português.
Fiz bons amigos e foi um privilégio e uma honra ter representado o FC Alverca nessas oito épocas, e de ter jogado ao lado de grandes jogadores de nível Mundial como Ricardo Carvalho, Deco, Maniche, Bruno Basto, Mantorras, Hugo Leal, Milinkovic, Nuno Assis, Bruno Aguiar, Ronald Garcia, Lima, Rui Borges, Cajú, Hugo Costa, José Soares, Valente, Paulo Santos, Kulkov, Anderson, Tinaia, Zeferino e muitos outros jogadores.

PC: Em 2004 o Alverca desceu à II Liga para não mais voltar à I, e o Ramires fez um percurso semelhante. Não teve convites para continuar a jogar na I Liga?
RR: Não, não tive nenhum convite para continuar a jogar na I Liga, para espanto meu, pois tinha realizado praticamente todos os jogos da época e nenhum clube se interessou por mim, estranhei claro, mas sabia bem que o futebol também tem estes momentos maus, e que são muito difíceis de ultrapassar.

PC: Dois anos depois estava a representar o Zamora, da II Divisão B espanhola, e mais tarde jogou cinco épocas no Luxemburgo. Como apareceu o convite para jogar em Espanha? O que retém dessas experiências que viveu no estrangeiro?
RR: O convite para jogar em Espanha surgiu através do meu amigo e colega Toni, que jogava no Zamora, e que em conversa com o seu treinador, este lhe disse que o Zamora procurava um extremo direito de qualidade, e foi então que o Toni mencionou o meu nome ao seu treinador. Fiz uns treinos e dois jogos para me verem jogar e assinei por uma época com outra de opção.
Em Espanha foi nostálgico para mim, foi como renascer para o futebol aos 30 anos, foi o facto de me sentir novamente jogador 'a sério' como em tempos na I Liga Portuguesa. O treinador espanhol gostava muito de mim, foi lá que marquei o melhor golo da minha carreira e só não acabei a carreira no Zamora, porque eu e o presidente tivemos um mal entendido aquando da renovação do meu contrato, o que originou a minha curta passagem pelo Zamora. A minha história em Espanha não é outra e de grande nível, porque cheguei muito tarde ao futebol espanhol, com 30 anos.
No Luxemburgo assinei três épocas e meia de contrato com o Benfica do Luxemburgo e uma época pelo Kayl Tétange. Foi uma honra e um privilégio ter jogado nestes dois clubes portugueses no Luxemburgo. Passei bons momentos e alguns maus, como é normal no futebol, mas fiz grandes amizades e tenho lá grandes amigos que me receberam de braços abertos aquando da minha chegada aos clubes e ao País. Quero, desde já, agradecer a eles todos: o meu muito obrigado por tudo e só não continuei a jogar até hoje, porque as lesões musculares não me largavam e, infelizmente, o meu corpo estava desgastado de muitos anos e assim terminei a minha carreira com 36 anos.

PC: Fez seis épocas na I Liga, qual foi a sua melhor?
RR: A minha melhor época na I Liga foi na época 2000/2001, com o mister Jesualdo Ferreira.

PC: Qual o lateral mais difícil que enfrentou?
RR: Foram vários, mas só vou mencionar três: Roberto Carlos, que defrontei no tal jogo amigável contra o Real Madrid; o Rui Jorge quando estava no Sporting, e o Esquerdinha do FC Porto.

PC: Tem 44 internacionalizações por Portugal em diversos escalões. Chegar à Seleção foi o ponto mais alto da sua carreira? 
RR: Sim, joguei em todas, só não consegui ser Internacional A.
Mas fui Campeão Olímpico no escalão de Sub-16, em Bruxelas, na Bélgica; ficámos em 4º lugar no Campeonato da Europa de Sub-16, no Chipre; fui Campeão Europeu de Sub-18 em Espanha, em Mérida; 3º lugar no Campeonato Mundo de Sub-20, no Qatar; e no primeiro jogo da Seleção B, fiz o golo do empate contra a Roménia.
Sem dúvida que este foi o ponto mais alto da minha carreira, pois para mim não existe feito maior do que representar o meu País. Penso que qualquer jogador profissional de futebol ambiciona jogar nas suas Seleções.
Foi um privilégio e tive a honra de ter representado o nosso País por muitos anos.

PC: Foi jogador de Mário Wilson durante algumas épocas. Tendo em conta que o "Velho Capitão" era conhecido pela boa-disposição e pelas histórias que tinha, que momento vivido com ele quer/gostava de partilhar?
RR: O mister Mário Wilson foi um dos treinadores que marcou a minha carreira, não só pelo bom treinador que era, mas sim, também, pelo ser humano que era.
Vou partilhar uma história com vocês, que aconteceu num determinado treino em Alverca, em que já na parte final do treino fizemos um jogo entre nós, a chamada 'peladinha', que tem o mesmo carácter que um jogo para nós, jogadores, e com apenas cinco minutos de 'pelada', o Deco faz um golo magistral e o mister Mário Wilson disse em voz alta: "Quem é este jogador? Só os mágicos é que marcam este tipo de golos, Deco, podes ir tomar banho!" e assim foi, o Deco foi tomar banho mais cedo que nós.

PC: Neste momento a única ligação que tem com o futebol, é o facto de representar os Veteranos do Benfica. Não gostava de voltar ao futebol noutras funções?
RR: Neste momento, trabalho na área da Saúde e Bem-Estar, sou empresário e distribuidor de um suplemento natural que é único, exclusivo e patenteado no Mundo: a 4Life Research.
Neste momento, não esta na minha mente estar ligado ao futebol de outra forma, mas nunca se sabe e, se isso acontecer, gostava de fazer parte de uma equipa técnica como treinador-adjunto, para começar.


A carreira de Ramires, aqui.

Veja um golo de Ramires ao FC Porto, logo no início do vídeo:


E aqui, por volta dos 2:15 do vídeo, outro golo diante do FC Porto: